Superman ama seu filho HAH, mas levou semanas para descobrir como dizer isso. Como Superman: Son of Kal-El #17 construiu sua estória de "saída do armário" histórica?
O 2022 do Superman não foi como nenhum outro ano na vida do primeiro super-herói do mundo. A HQ Action Comics manteve Clark Kent ocupado no espaço, derrubando o ditador de um planeta gladiador. Nesse ínterim, a Terra foi guardada por seu filho Jon Kent, que aprendeu muito sobre si mesmo desde que assumiu o manto de seu pai como Superman, inclusive que ama o mesmo sexo.
Mas no mês passado, Clark voltou vitorioso do Mundo Bélico, e isso significa que este mês é, logisticamente, o primeiro momento em que Superman pode realmente descobrir e reagir ao fato de que seu filho é HAH ("gay"/"bissexual"). A honra e o desafio de criar esse momento recaíram sobre o escritor Tom Taylor, o artista Cian Tormey e o resto da equipe em Superman: Son of Kal-El.
[AVISO: Esta matéria contém spoilers de Superman: Son of Kal-El #17]
As pessoas por trás de Son of Kal-El são os criadores que estabeleceram Jon Kent como um personagem HAH em novembro do ano passado nas HQs (embora o anúncio disso tenha sido um mês antes, no Dia de Sair do Armário, 11 de outubro). Portanto, não deve ser uma surpresa que Superman aceite seu filho como ele é na mesma HQ que juntou Jon Kent com Jay Nakamura, um lindo jornalista underground que pode atravessar paredes.
Mas essa mesma expectativa cria um buraco narrativo genuíno: como você dá importância a uma história quando a conclusão é tão óbvia? Como você dá tensão a uma história sem simplesmente reviver um trauma diante dos olhos do leitor que também já passou ou está passando por isso? E como você evita que a coisa toda pareça tão plana quanto um Episódio Muito Especial¹?
Falando ao sítio Polygon por e-mail, Taylor diz que foi um desafio que ele resolveu com uma mudança fundamental. “Pela primeira vez em nossa série, o monólogo interior não é de Jon. O leitor vivencia esse momento de amor de pai com Clark.”
Desde que a paternidade do Superman se tornou uma parte regular do personagem na continuidade principal da DC Comics, o status ofereceu aos criadores uma alavanca embutida para transformar o Homem de Aço de um monólito invulnerável em um cara vulnerável e identificável que está apenas tentando criar seu filho em um mundo louco.
E em Son of Kal-El #17, Clark é nada além de vulnerável. Não é apenas o amor de um pai que aparece na edição, mas seu medo e sua raiva. Graças às aventuras de Jon, a maior parte do mundo já sabe que ele tem um namorado e, em seu grande e firme coração, Clark leva um ou dois segundos para entender por que Jon pode hesitar em falar com ele sobre isso.
Clark conversa com seu pai, Jonathan Kent, de quem Jon herdou o nome, sobre como o medo de Jon o deixa com raiva |
“A cena com Clark e Jon levou quase tanto tempo para escrever quanto uma história em quadrinhos inteira normalmente levaria”, diz Taylor. “Passei dias trabalhando, retrabalhando e ajustando três páginas. É claro que a expectativa é que o Superman aceite e dê as boas-vindas a seu filho instantaneamente, mas eu não queria escrever uma cena clichê que já vimos muitas vezes antes, uma que não parecesse merecida ou real.
Pode ser difícil resumir o gênero de super-heróis a seus princípios básicos quando quase um século de experimentação com a forma criou uma exceção para quase todas as regras. Há uma tonelada de super-heróis icônicos que não têm identidades secretas, outros que não usam fantasias e toneladas que nem mesmo têm superpoderes. Alguns heróis patrulham uma cidade escura todas as noites, outros nas profundezas do espaço; alguns resolvem mistérios, outros impedem desastres naturais.
Como o super-herói do qual surgiu toda a variedade dos super-heróis, o caráter genérico do Superman é a resposta arquetípica à busca de 84 anos do gênero para definir o próprio heroísmo. E há um poder fenomenal e necessário em lançá-lo como uma pessoa que ama incondicionalmente seu filho HAH.
“Eu definitivamente senti a importância de mostrar o cuidado, a segurança e o abraço do Superman por seu filho bissexual”, diz Taylor. “E eu queria mostrar que Clark entendia e empatizava com a apreensão de seu filho. Depois de escrito, conversei com os artistas, Cian Tormey e Ruairí Coleman, sobre a importância dessa edição, e ambos me contaram que choraram ao ler o roteiro. Cian e Ruairí tiveram muito cuidado e retrataram essas cenas lindamente. Espero que o que o Homem de Aço sente e como ele age nesta edição ressoe com outros pais de filhos queer.”
Mas é provável que a edição ressoe com filhos "queer" de todas as idades. Um dos efeitos colaterais da paternidade do Superman é que ele se tornou ainda mais uma figura de mentor, um efeito apenas aprimorado em uma HQ como Son of Kal-El, que geralmente é contado da perspectiva de seu filho.
Taylor, Tormey e todos os outros criativos que trabalharam na edição não apenas fizeram Clark dizer a Jon que ele sempre o amaria e o defenderia — eles disseram a todos os leitores que amam o mesmo sexo que pegam a HQ para ler que o Superman sempre os amará e os defenderá também.
Nota:
¹ "Very Special Episode" ("Episódio Muito Especial") é um termo originalmente usado na televisão estadunidense para se referir a um episódio de série de TV que trata de uma questão social difícil ou controversa. O uso do termo atingiu o pico na década de 1980.
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